Morre Sebastião Salgado, o brasileiro que se tornou ícone da fotografia mundial, aos 81 anos - Opinião Manauara

PUBLICIDADE

Últimas

Morre Sebastião Salgado, o brasileiro que se tornou ícone da fotografia mundial, aos 81 anos

Fotógrafo documentou injustiças sociais pelo mundo em imagens que uniam reflexão e emoção



Morreu nesta sexta-feira (23), aos 81 anos, o fotógrafo Sebastião Salgado. Conhecido por seu trabalho documental e sua assinatura visual em preto e branco, recebeu praticamente todos os principais prêmios de fotografia do mundo. A informação da morte foi confirmada por uma fonte próxima da família.


Nascido na vila de Conceição do Capim, em Minas Gerais, em 1944, Salgado transformou o fotojornalismo. Seu registro das injustiças sociais e das populações marginalizadas atravessou fronteiras, mostrando a realidade de trabalhadores rurais, refugiados, povos originários e territórios em risco. Seu estilo inconfundível unia emoção, reflexão e forte apelo estético, lirismo e denúncia, sempre com domínio da luz natural, o contraste marcante do preto e branco e uma composição inspirada.

Salgado estava com uma exposição em cartaz na França. A mostra organizada no centro Les Franciscaines, em Deauville, reúne mais de 400 obras de Salgado, todas do acervo do Maison Européenne 


'Amor pela humanidade'


"Sebastião foi muito mais do que um dos maiores fotógrafos de nosso tempo", afirmou em nota o perfil oficial do Instituto Terra, uma ONG de educação ecossistêmica fundada pelo próprio Salgado com sua esposa Lélia Wanick. "Ao lado de sua companheira de vida, Lélia Deluiz Wanick Salgado, semeou esperança onde havia devastação e fez florescer a ideia de que a restauração ambiental é também um gesto profundo de amor pela humanidade. Sua lente revelou o mundo e suas contradições; sua vida, o poder da ação transformadora".


Formado em economia, com mestrado na Universidade de São Paulo e na Sorbonne, Salgado realizou as suas primeiras sessões de foto com uma Leica em viagens a trabalho pela África. Três anos depois, decidido a se dedicar exclusivamente à sua paixão, Salgado abandonou seu cargo de secretário da Organização Internacional do Café e se especializou como fotojornalista independente. 


Início na Magnum


Com base em Paris, ele trabalhou para agências de fotografia de prestígio como Sygma e Gamma, antes de entrar para a Magnum. Em 1981, um incidente mudou a vida do fotógrafo. Salgado cobria os 100 primeiros dias do governo Ronald Reagan quando o presidente americano foi vítima de um atentado a tiros em Washington. As imagens feitas por Salgado viajaram o mundo e, com o dinheiro da venda para os jornais, pode financiar uma viagem à África, onde produziria o seu primeiro projeto autoral. 


Seu primeiro livro, "Outras Américas", de 1986, marcou um retorno às suas origens, documentando a paisagem geográfica e humana de cidades do litoral brasileiro e de países como Bolívia, Chile, Peru, Equador, Guatemala e México.. “Meu único desejo era voltar à minha terra bem-amada, para meu Brasil do qual um exílio um pouco forçado me obrigou a me afastar”, disse o fotógrafo na época. Reunindo um trabalho fotográfico entre 1977 e 1983, a obra mostra a condições de vida dos camponeses e a resistência cultural dos indígenas latino-americanos.



Em 1994, Salgado voltou a fixar residência em Paris com sua esposa, Lélia. Para representar seu trabalho e garantir controle da sua obra, o casal fundou a sua própria agência de notícias, As Imagens da Amazônia, que também funcionava como uma espécie de ateliê curatorial. Longe das pressões comerciais, montou uma estrutura necessária para seus próximos projetos, que resultaram nos livros "Trabalhadores", "Terra", "Êxodos", "Gênesis" e "Amazônia".

"Terra", de 1997, tem como ponto central o drama dos trabalhadores rurais sem-terra nos embates pela reforma agrária. O fotógrafo registra os acampamentos, os assentamentos e as ocupações realizadas pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Além do livro, que traz prefácio do Nobel de Literatura José Saramago, o projeto conta ainda com um álbum homônimo de Chico Buarque. 


Lançado em 2000, o monumental "Êxodos" é fruto de seis anos de pesquisa sobre os movimentos migratórios do final do século XX e o desalojamento em massa forçado por guerras, perseguições, fome, miséria ou desastres ambientais. Aclamada internacionalmente, a obra contribuiu para o debate público sobre os efeitos da globalização nos direitos humanos e desigualdade global.


Entre florestas e geleiras


Outro ambicioso projeto, "Gênesis" revela a beleza, fragilidade e resiliência de mais de 30 regiões remotas do planeta. Salgado afirmou na época que a natureza estava "falando" com sua câmera, que registrou florestas, geleiras, desertos e outros ecossistemas ameaçados pelas mudanças climáticas. Retratou ainda animais em extinção e povos originários que vivem em equilíbrio com seus ambientes.


Em 2024, Salgado teve uma de suas imagens incluída na lista das 25 fotografias que definem a era moderna, de acordo com o New York Times. A seleção reúne registros feitos em diversas partes do mundo desde 1955. A fotografia de Salgado, escolhida pelo jornal americano, retrata operários em atividade num garimpo da Serra Pelada, no sudeste do estado do Pará. O clique foi feito em 1986.


Em entrevista à AFP em abril de 2024, quando inaugurava retrospectiva dos 50 anos de carreira em exposição na Somerset House, em Londres, o fotógrafo Sebastião Salgado comentou sobre aquele seu momento de vida:


— Só me falta morrer agora. Tenho 50 anos de carreira e completei 80 anos. Estou mais perto da morte do que de outra coisa. Uma pessoa vive no máximo 90 anos. Então, não estou longe, mas continuo fotografando, continuo trabalhando, continuo fazendo as coisas da mesma forma Não tenho nenhuma preocupação nem nenhuma pretensão de como serei lembrado. É minha vida que está nas fotos e nada mais — explicou na ocasião o fotógrafo.

Nenhum comentário